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@ talvasconcelos
2025-04-23 14:39:01Dizem-nos que a inflação é necessária. Mas e se for, afinal, a raiz da disfunção económica que enfrentamos?
A crença mainstream é clara: para estimular o crescimento, os governos devem poder desvalorizar a sua moeda — essencialmente, criar dinheiro do nada. Supostamente, isso incentiva o investimento, aumenta o consumo e permite responder a crises económicas. Esta narrativa foi repetida tantas vezes que se tornou quase um axioma — raramente questionado.
No centro desta visão está a lógica fiat-keynesiana: uma economia estável exige um banco central disposto a manipular o valor do dinheiro para alcançar certos objectivos políticos. Esta abordagem, inspirada por John Maynard Keynes, defende a intervenção estatal como forma de estabilizar a economia durante recessões. Na teoria, os investidores e consumidores beneficiam de taxas de juro artificiais e de maior poder de compra — um suposto ganho para todos.
Mas há outra perspectiva: a visão do dinheiro sólido (sound money, em inglês). Enraizada na escola austríaca e nos princípios da liberdade individual, esta defende que a manipulação monetária não é apenas desnecessária — é prejudicial. Uma moeda estável, não sujeita à depreciação arbitrária, é essencial para promover trocas voluntárias, empreendedorismo e crescimento económico genuíno.
Está na hora de desafiar esta sabedoria convencional. Ao longo dos próximos capítulos, vamos analisar os pressupostos errados que sustentam a lógica fiat-keynesiana e explorar os benefícios de um sistema baseado em dinheiro sólido — como Bitcoin. Vamos mostrar por que desvalorizar a moeda é moralmente questionável e economicamente prejudicial, e propor alternativas mais éticas e eficazes.
Este artigo (que surge em resposta ao "guru" Miguel Milhões) pretende iluminar as diferenças entre estas duas visões opostas e apresentar uma abordagem mais sólida e justa para a política económica — centrada na liberdade pessoal, na responsabilidade individual e na preservação de instituições financeiras saudáveis.
O Argumento Fiat: Por que Dizem que é Preciso Desvalorizar a Moeda
Este argumento parte geralmente de uma visão económica keynesiana e/ou estatista e assenta em duas ideias principais: o incentivo ao investimento e a necessidade de resposta a emergências.
Incentivo ao Investimento
Segundo os defensores do sistema fiat, se uma moeda como o ouro ou bitcoin valorizar ao longo do tempo, as pessoas tenderão a "acumular" essa riqueza em vez de investir em negócios produtivos. O receio é que, se guardar dinheiro se torna mais rentável do que investir, a economia entre em estagnação.
Esta ideia parte de uma visão simplista do comportamento humano. Na realidade, as pessoas tomam decisões financeiras com base em múltiplos factores. Embora seja verdade que activos valorizáveis são atractivos, isso não significa que os investimentos desapareçam. Pelo contrário, o surgimento de activos como bitcoin cria novas oportunidades de inovação e investimento.
Historicamente, houve crescimento económico em períodos de moeda sólida — como no padrão-ouro. Uma moeda estável e previsível pode incentivar o investimento, ao dar confiança nos retornos futuros.
Resposta a Emergências
A segunda tese é que os governos precisam de imprimir dinheiro rapidamente em tempos de crise — pandemias, guerras ou recessões. Esta capacidade de intervenção é vista como essencial para "salvar" a economia.
De acordo com economistas keynesianos, uma injecção rápida de liquidez pode estabilizar a economia e evitar colapsos sociais. No entanto, este argumento ignora vários pontos fundamentais:
- A política monetária não substitui a responsabilidade fiscal: A capacidade de imprimir dinheiro não torna automaticamente eficaz o estímulo económico.
- A inflação é uma consequência provável: A impressão de dinheiro pode levar a pressões inflacionistas, reduzindo o poder de compra dos consumidores e minando o próprio estímulo pretendido. Estamos agora a colher os "frutos" da impressão de dinheiro durante a pandemia.
- O timing é crítico: Intervenções mal cronometradas podem agravar a situação.
Veremos em seguida porque estes argumentos não se sustentam.
Rebatendo os Argumentos
O Investimento Não Morre num Sistema de Dinheiro Sólido
O argumento de que o dinheiro sólido mata o investimento falha em compreender a ligação entre poupança e capital. Num sistema sólido, a poupança não é apenas acumulação — é capital disponível para financiar novos projectos. Isso conduz a um crescimento mais sustentável, baseado na qualidade e não na especulação.
Em contraste, o sistema fiat, com crédito barato, gera bolhas e colapsos — como vimos em 2008 ou na bolha dot-com. Estes exemplos ilustram os perigos da especulação facilitada por políticas monetárias artificiais.
Já num sistema de dinheiro sólido, como o que cresce em torno de Bitcoin, vemos investimentos em mineração, startups, educação e arte. Os investidores continuam activos — mas fazem escolhas mais responsáveis e de longo prazo.
Imprimir Dinheiro Não Resolve Crises
A ideia de que imprimir dinheiro é essencial em tempos de crise parte de uma ilusão perigosa. A inflação que se segue reduz o poder de compra e afecta especialmente os mais pobres — é uma forma oculta de imposto.
Além disso, soluções descentralizadas — como os mercados, redes comunitárias e poupança — são frequentemente mais eficazes. A resposta à COVID-19 ilustra isso: grandes empresas foram salvas, mas pequenos negócios e famílias ficaram para trás. Os últimos receberam um amuse-bouche, enquanto os primeiros comeram o prato principal, sopa, sobremesa e ainda levaram os restos.
A verdade é que imprimir dinheiro não cria valor — apenas o redistribui injustamente. A verdadeira resiliência nasce de comunidades organizadas e de uma base económica saudável, não de decretos políticos.
Dois Mundos: Fiat vs. Dinheiro Sólido
| Dimensão | Sistema Fiat-Keynesiano | Sistema de Dinheiro Sólido | |----------|--------------------------|-----------------------------| | Investimento | Estimulado por crédito fácil, alimentando bolhas | Baseado em poupança real e oportunidades sustentáveis | | Resposta a crises | Centralizada, via impressão de moeda | Descentralizada, baseada em poupança e solidariedade | | Preferência temporal | Alta: foco no consumo imediato | Baixa: foco na poupança e no futuro | | Distribuição de riqueza | Favorece os próximos ao poder (Efeito Cantillon) | Benefícios da deflação são distribuídos de forma mais justa | | Fundamento moral | Coercivo e redistributivo | Voluntário e baseado na liberdade individual |
Estes contrastes mostram que a escolha entre os dois sistemas vai muito além da economia — é também uma questão ética.
Consequências de Cada Sistema
O Mundo Fiat
Num mundo dominado pelo sistema fiat, os ciclos de euforia e colapso são a norma. A desigualdade aumenta, com os mais próximos ao poder a lucrar com a inflação e a impressão de dinheiro. A poupança perde valor, e a autonomia financeira das pessoas diminui.
À medida que o Estado ganha mais controlo sobre a economia, os cidadãos perdem capacidade de escolha e dependem cada vez mais de apoios governamentais. Esta dependência destrói o espírito de iniciativa e promove o conformismo.
O resultado? Estagnação, conflitos sociais e perda de liberdade.
O Mundo com Dinheiro Sólido
Com uma moeda sólida, o crescimento é baseado em valor real. As pessoas poupam mais, investem melhor e tornam-se mais independentes financeiramente. As comunidades tornam-se mais resilientes, e a cooperação substitui a dependência estatal.
Benefícios chave:
- Poupança real: A moeda não perde valor, e a riqueza pode ser construída com estabilidade.
- Resiliência descentralizada: Apoio mútuo entre indivíduos e comunidades em tempos difíceis.
- Liberdade económica: Menor interferência política e mais espaço para inovação e iniciativa pessoal.
Conclusão
A desvalorização da moeda não é uma solução — é um problema. Os sistemas fiat estão desenhados para transferir riqueza e poder de forma opaca, perpetuando injustiças e instabilidade.
Por outro lado, o dinheiro sólido — como Bitcoin — oferece uma alternativa credível e ética. Promove liberdade, responsabilidade e transparência. Impede abusos de poder e expõe os verdadeiros custos da má governação.
Não precisamos de mais inflação — precisamos de mais integridade.
Está na hora de recuperarmos o controlo sobre a nossa vida financeira. De rejeitarmos os sistemas que nos empobrecem lentamente e de construirmos um futuro em que o dinheiro serve as pessoas — e não os interesses políticos.
O futuro do dinheiro pode e deve ser diferente. Juntos, podemos criar uma economia mais justa, livre e resiliente — onde a prosperidade é partilhada e a dignidade individual respeitada.
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