
@ The Narrator
2025-04-25 18:30:31
**STF forma maioria para condenar mulher que pichou estátua com batom a pelo menos 11 anos**
*Artigo de Raquel Derevecki e Denise Drechsel publicado em 25/04/2025 na Gazeta do Povo*
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para condenar a pelo menos 11 anos de prisão a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pichou a estátua da Justiça com batom durante os atos de 8 de janeiro de 2023. Dos cinco ministros do colegiado, falta apenas o voto da ministra Cármen Lúcia. O julgamento foi retomado nesta sexta-feira (25), em plenário virtual, após um pedido do ministro Luiz Fux.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, votou em 21 de março pela condenação da cabeleireira a 14 anos de prisão pelos crimes de associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, deterioração de patrimônio tombado, e dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União – entendimento seguido pelo ministro Flavio Dino.
Nesta sexta-feira, por volta das 11h, Fux votou por reduzir a pena a um ano e meio, admitindo apenas o crime previsto no artigo 62, inciso I à Lei 9.605/98, que trata sobre “destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei”. Logo em seguida, no entanto, o ministro Cristiano Zanin se manifestou favorável ao entendimento de Moraes, apenas sugerindo uma pena menor, de 11 anos.
**Ministros ainda podem alterar votos**
O voto de Fux trouxe esperança à defesa. Caso os ministros Cristiano Zanin e Cármen Lúcia concordassem com ele, Débora, que ficou dois anos presa, conseguiria a liberdade, já que atualmente segue em prisão domiciliar com diversas medidas cautelares.
Com a manifestação de Zanin, no entanto, essa possibilidade só existe se Cármen Lúcia divergir do relator e algum dos ministros que já votou pela condenação — Alexandre de Moraes, Flavio Dino ou Cristiano Zanin — reavaliar o voto.
À Gazeta do Povo, Rodrigo Chemim, doutor em Direito de Estado, afirma que o julgamento se encerra após a proclamação do resultado final que, nesse caso, está marcado para 6 de maio.
"Até lá, é possível um ministro alterar seu voto", aponta o jurista, ao citar um exemplo da ministra Cármen Lúcia, que alterou seu voto na discussão a respeito da suspeição de Sérgio Moro na Operação Lava Jato, em 2021.
**Luiz Fux votou por pena de 1 ano e meio de reclusão à cabeleireira**
Ao contrário de Moraes, que imputou cinco crimes à cabeleireira, Fux considerou que ela cometeu apenas um delito. Fux negou que Débora tenha cometido os crimes de associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União.
No voto do ministro Luiz Fux, ele afirma que Débora confessou a prática delituosa de pichar a estátua com batom, mas que sua conduta foi individual e isolada. “Não há qualquer prova do envolvimento da ré com outros réus, tampouco da sua participação, mínima que seja, nos demais atos praticados nas sedes dos três poderes”, afirmou.
O magistrado aponta ainda que “não há indício de que a ré tenha adentrado algum dos edifícios, auxiliado outros acusados ou empregado violência contra pessoas ou objetos”, o que contesta a tese de crime multitudinário.
**Alexandre de Moraes defende a tese de crime multitudinário**
O voto de Fux diverge do entendimento do relator Alexandre de Moraes, que foi seguido por Flávio Dino e Zanin. Em seu voto, Moraes afirma ter existido crime de multidão, em que todas as pessoas presentes durante os atos de 8 de janeiro seriam consideradas culpadas pelas ações registradas, independentemente de conduta individual.
“A invasão aos prédios públicos se deu em contexto de crime multitudinário, ou de multidão delinquente, sendo dispensável, portanto, a identificação de quem tenha efetivamente causado os inúmeros danos”, escreveu Moraes no voto.
Portanto, ainda que a cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos não tenha entrado em prédio público e sua participação nos atos de vandalismo tenha sido somente a pichação, com batom, na estátua “A Justiça”, o relator entende que ela deveria ser condenada pelos crimes de associação criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, deterioração de patrimônio tombado, e dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União.
O voto de Alexandre de Moraes condena Débora à pena de 14 anos, sendo 12 anos e 6 meses de reclusão e 1 ano e 6 meses de detenção. Além disso, o magistrado estabelece pagamento de multa de R$ 30 milhões para ser dividido entre todos os envolvidos nos atos do 8 de janeiro que forem condenados.
Após a publicação do voto do relator, o ministro Luiz Fux suspendeu o julgamento da cabeleireira e comentou sobre o caso, afirmando que, em determinadas ocasiões, se deparou com “peça exacerbada” e, por isso, queria analisar o contexto em que a mulher se encontrava nos atos de 8/1.
“Nós julgamos sob violenta emoção após a verificação da tragédia do 8 de janeiro. Eu fui ao meu ex-gabinete e vi mesa queimada, papeis queimados […] Mas eu acho que os juízes na sua vida têm sempre que refletir dos erros e dos acertos, até porque os erros autenticam a nossa humanidade”, ponderou o ministro.
Logo após a declaração de Fux, Moraes disse defender a “total independência” dos magistrados, mas ressaltou que não seria possível “relativizar” a conduta de Débora.
**Relembre o caso de Débora Rodrigues**
Débora tem 39 anos, é moradora de Paulínia, São Paulo, e mãe de dois filhos, de sete e dez anos. Ela foi presa dia 17 de março de 2023, durante a oitava fase da Operação Lesa Pátria, deflagrada pela Polícia Federal (PF).
Débora passou mais de 400 dias na prisão sem denúncia — quase 12 vezes mais que o prazo estabelecido em lei —, e seus advogados sempre afirmaram que as acusações contra ela são “genéricas”, pois as provas existentes apontam somente a pichação da estátua da justiça, com batom. Pela Lei, essa ação é considerada um “crime de menor potencial ofensivo” e costuma ser punida com pagamento de cestas básicas.
Débora passou dois anos presa e chegou a escrever, em 2024, uma carta pedindo desculpas a Moraes. “Repudio o vandalismo, contudo eu estava ali porque eu queria ser ouvida, queria maiores explicações sobre o resultado das eleições tão conturbadas de 2022. “Por isso, no calor do momento cheguei a cometer aquele ato tão desprezível (pichar a estátua)”, disse no texto. “Me arrependo deste ato amargamente, pois causou separação entre mim e meus filhinhos”, afirmou.
A cabeleireira obteve prisão domiciliar após a suspensão do julgamento e segue em casa, com tornozeleira eletrônica e diversas medidas restritivas. Entre as medidas está proibição de usar redes sociais, de se comunicar com outros envolvidos no 8 de janeiro, conceder entrevistas e receber visitas. Ela só tem contato com seus advogados e familiares mais próximos.
Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/stf-maioria-debora-pichacao-batom-estatua/