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@ TAnOTaTU
2025-03-03 10:51:10
**Análise Marxista da República no Brasil**
A República no Brasil, desde sua proclamação em 1889 até os dias atuais, reflete as contradições de um sistema capitalista periférico, marcado pela dominação de classes, dependência externa e reprodução de desigualdades históricas. A análise marxista revela como a estrutura republicana manteve e reconfigurou relações de exploração, adaptando-se a novas fases do capitalismo global.
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### **1. Base Econômica e Formação do Capitalismo Brasileiro**
A República foi estabelecida em um contexto de transição do **modo de produção escravista** para uma economia capitalista dependente. A **política do "café-com-leite"** (1889-1930) consolidou a hegemonia da oligarquia cafeeira, que manteve o latifúndio e a monocultura de exportação, agora com trabalho assalariado precário (colonos imigrantes e ex-escravizados). A acumulação de capital ocorria via:
- **Exportação de commodities** (café, borracha) vinculada ao imperialismo britânico e estadunidense.
- **Subordinação ao capital financeiro internacional**, com dívida externa e ferrovias construídas por empresas estrangeiras.
A industrialização tardia, a partir dos anos 1930, foi impulsionada pelo Estado (Era Vargas) e pelo capital estrangeiro, mas manteve o **caráter periférico** da economia: produção de bens de consumo não-duráveis, baixa tecnologia e superexploração da força de trabalho.
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### **2. Relações de Classe e Luta de Classes**
A República sempre foi marcada por uma **aliança entre burguesia agrária, industrial e financeira**, com apoio das classes médias urbanas, em detrimento das massas trabalhadoras:
#### **a) República Velha (1889-1930): Oligarquias e Exclusão**
- **Classe dominante**: Oligarquias rurais (SP, MG, RJ) e elites comerciais, que controlavam o Estado através do voto de cabresto e do coronelismo.
- **Classe trabalhadora**: Imigrantes europeus (nas fábricas emergentes), camponeses sem-terra e população negra marginalizada. A repressão a greves (como a Greve Geral de 1917) e a ausência de direitos sociais evidenciavam a **exploração superexploradora**.
#### **b) Era Vargas (1930-1945): Populismo e Regulação**
Vargas cooptou a classe trabalhadora urbana via **CLT (1943)** e sindicatos pelegos, enquanto reprimia movimentos radicais (como a Intentona Comunista de 1935). A burguesia industrial ganhou força, mas o Estado manteve o pacto com o capital internacional (ex.: acordo de Washington para a siderurgia).
#### **c) Ditadura Militar (1964-1985): Capitalismo Selvagem**
O golpe apoiado pela burguesia nacional e imperialismo (EUA) impôs um **Estado de exceção** para conter a ameaça comunista e garantir lucros. A repressão aos trabalhadores (AI-5, tortura) e a concentração de renda (milagre econômico) ampliaram a **miséria estrutural**.
#### **d) Neoliberalismo (1990-presente): Financeirização e Precarização**
A abertura comercial (FHC) e as privatizações destruíram indústrias nacionais, enquanto o capital financeiro (bancos, agronegócio) passou a dominar a economia. A reforma trabalhista de 2017 e a PEC do Teto de Gastos (2016) aprofundaram a **exploração flexível** e a desigualdade.
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### **3. Superestrutura: Estado, Ideologia e Repressão**
O Estado republicano sempre serviu à classe dominante, adaptando-se para manter a ordem:
- **República Velha**: Coronelismo, voto de cabresto e ideologia positivista ("Ordem e Progresso") legitimavam a dominação oligárquica.
- **Era Vargas**: Nacionalismo e paternalismo estatal mascaravam a aliança com o imperialismo.
- **Ditadura Militar**: Propaganda ufanista e doutrina de segurança nacional criminalizavam a esquerda.
- **Neoliberalismo**: Ideologia meritocrática e neoliberal ("Estado mínimo") naturaliza a desigualdade, enquanto o judiciário criminaliza movimentos sociais (ex.: Lava Jato como instrumento político).
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### **4. Contradições e Crises do Sistema**
A República brasileira é marcada por crises cíclicas, resultantes de contradições internas e externas:
- **Crise de 1929**: Queda do preço do café expôs a fragilidade da economia agroexportadora, levando ao colapso da República Velha.
- **Crise de 1964**: Medo da burguesia diante das reformas de base propostas por João Goulart (reforma agrária, nacionalização) motivou o golpe militar.
- **Crise de 2013-2016**: Protestos contra o aumento das tarifas e a Copa do Mundo revelaram insatisfação popular, cooptada pela elite para o golpe contra Dilma Rousseff.
- **Crise atual (2020s)**: Pandemia, desindustrialização e desmonte do Estado aprofundam a crise social, com Bolsonaro e Lula representando polarizações superficiais que não questionam o capitalismo.
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### **5. Legado e Interseccionalidade Raça/Classe**
A República manteve as estruturas racistas herdadas da escravidão:
- **Negros e periféricos**: Sobrerrepresentados entre os desempregados, presos e vítimas da violência policial.
- **Feminização da pobreza**: Mulheres negras, majoritárias entre trabalhadoras domésticas subpagas.
- **Agronegócio vs. Camponeses**: O latifúndio (herdeiro do escravismo) expulsa comunidades tradicionais (quilombolas, indígenas) para expandir monoculturas.
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### **6. Contribuições de Intelectuais Marxistas**
- **Florestan Fernandes**: Analisou a **herança escravista** na exclusão social e na formação de uma "democracia racial" falsa.
- **Ruy Mauro Marini**: Desenvolveu a teoria da **dependência**, explicando como o capitalismo periférico se subordina ao centro imperialista.
- **Marilena Chauí**: Criticou a **colonialidade do poder** na ideologia republicana, que naturaliza a dominação.
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### **Conclusão**
A República brasileira é um **Estado capitalista periférico**, cujas instituições e crises refletem a dominação de classes e a subordinação ao imperialismo. Apesar de mudanças superficiais (como a Constituição de 1988), as estruturas de exploração persistem: latifúndio, racismo estrutural e dependência externa. A esquerda enfrenta o desafio de articular uma **alternativa anticapitalista** que supere a lógica republicana de conciliação de classes.