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@ fiatjaf
2024-01-14 13:55:28
# Sócrates homofóbico
Trechos de episódios da _Memorabilia_, ou os _Ditos e Feitos Memoráveis de Sócrates_, contados por Xenofonte (na edição que tem um prefácio do glorioso Pessanha) que mostram Sócrates sempre aconselhando os jovens a não praticar o homossexualismo -- **nem mesmo quando encontrassem alguém que fosse belo**:
— Dize-me, Xenofonte, não tinhas Critobulo na conta de jovem sábio antes que de amoroso indiscreto, homem prudente antes que insensato e temerário?
— Certamente — conveio Xenofonte.
— Pois bem, considera-o, doravante como o mais impulsivo e arrojado dos homens, capaz de desafiar o ferro e afrontar o fogo.
— Que o viste fazer — indagou Xenofonte — para acusá-lo dessa maneira?
— Pois não teve a temeridade de furtar um beijo ao filho de Alcibíades, jovem de tamanha beleza e frescor?
— Ora, isso é ato de temerário! — retrucou Xenofonte. — Estou que eu próprio bem poderia cometer semelhante temeridade.
— Desgraçado! — exclamou Sócrates. — Imaginas o que te sucederia se beijasses uma pessoa jovem e bela? Ignoras que de livre, num momento te tomarias escravo? Que pagarias caro prazeres perigosos? Que já não terias animo de perquirir o que é o belo e o bem? Que haverias de dar cabeçadas como um louco?
— Por Hércules! — retrucou Xenofonte — que terrível poder emprestas a um beijo!
— Admira-te? — perguntou Sócrates. — Não sabes que as tarântulas, que não são maiores que a moeda de meio óbolo, com o só tocar os lábios causam ao homem dores tremendas e privam-no da razão?
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— Pois bem! — disse Critobulo — não usarei de coação com ninguém; se, pois, tens algo a dizer-me sobre como conquistar amigos, fala.
— Jamais — disse Sócrates — porás boca contra boca.
— Tranqüiliza-te. Não mais comprimirei os lábios a os lábios de ninguém, a menos que seja belo.
— Eis-te logo de saída, Critobulo, fazendo o contrário do que se deve. Os que são belos não suportam de bom grado essas liberdades, conquanto os tolerem os feios, convencidos de que os acham belos de alma.
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Eis como se devia julgar Sócrates. Cometeu ele próprio algum mal? Merece ser tratado como perverso. Porém, se jamais deixou de ser homem de bem, será justo acusá-lo de uma depravação que não lhe cabe? Se, embora abstêmio do mal, houvesse assistido sem desaprová-los aos atos vergonhosos dos outros, estaria no direito de censurá-lo. Mas, tendo percebido que Crítias, enamorado de Eutidemo, queria gozá-lo à maneira dos que abusam do próprio corpo para satisfazer seus desejos amorosos, forcejou por demovê-lo de semelhante intento, dizendo-lhe indigno de homem livre e indecente a amigo da virtude ir como mendicante solicitar algo do objeto amado, junto ao qual cumpre sobretudo fazer-se valer, e ainda mais solicitar coisa oprobriosa. Crítias fazia ouvidos de mercador e não dava de si. Então se pretende haver Sócrates dito ante numerosa assistência e em presença de Eutidemo que Crítias lhe parecia ter tai ou qual semelhança com um porco, pois queria esfregar-se em Eutidemo como se esfregam os porcos nas pedras. Desde então Crítias se tornou inimigo jurado de Sócrates. Nomeado um dos Trinta e monoteta com Cáricles, guardou-lhe rancor e proibiu por lei o ensino da oratória. Assim atacava Sócrates. Não tendo de que acusá-lo, carregava-o com a censura que de comum se ínsimula aos filósofos e caluniava-o junto à opinião pública.